segunda-feira, 12 de setembro de 2011

O FIM DO VERÃO


Sinto-me na margem da vida
Que passa como água correndo
Preciso ouvir uma palavra amiga
Solta e livre como asas ao vento

Sinto que o fim se aproxima
Sei que o tempo me falta
Sei que o Verão está a acabar
A seguir as folhas vão cair
E o frio do Inverno vai chegar

CN 9/2011

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Quando eu nasci


Quando eu nasci,
ficou tudo como estava,
Nem homens cortaram veias,
nem o Sol escureceu,
nem houve Estrelas a mais...
Somente,
esquecida das dores,
a minha Mãe sorriu e agradeceu.

Quando eu nasci,
não houve nada de novo
senão eu.

As nuvens não se espantaram,
não enlouqueceu ninguém...

P'ra que o dia fosse enorme,
bastava
toda a ternura que olhava
nos olhos de minha Mãe...

José Régio

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Filmes a não perder (clássicos do cinema)

Jean de Florette (1ª parte) e Manon das Nascentes (2ª parte) é um épico francês de 1986, realizado por Claude Berri, que rivaliza com os melhores filmes produzidos em Hollywood. A 1ª parte é mais interessante, valoriza o ser humano através da persistência perante a vontade de vencer, enquanto a 2ª parte revela um sentimento mais obscuro: a vingança servida no momento oportuno, como se se tratasse de um acto de justiça ou como se a justiça não fosse um acto de vingança. É uma superprodução, que foge ao padrão noveleiro, mas interessa e entusiasma o espectador até ao fim. Yves Montand, Gérard Dépardieu e particularmente Daniel Auteuil têm papéis dignos de vencer o óscar, que só não aconteceu porque o filme não é americano. No entanto o filme venceu 4 BAFTA, entre os quais o de Melhor Filme e Melhor Actor Secundário (Daniel Auteuil) que é soberbo e inesquecível no papel de Ugolin.

Filmes a não perder (clássicos do cinema)

INHERIT THE WIND (1960) de Stanley Kramer é um filme americano dos anos 60 que nunca foi comercializado em Portugal (talvez porque a igreja católica, na altura, exercia grande influência na censura). É um filme inesquecível e um monumento ao cinema.
Trata dum problema ancestral: a relação entre a religião e a ciência. Na Idade Média o saber estava concentrado na igreja, pois quanto mais inculto fosse o povo mais fácil seria manipulá-lo. Tudo isso está bem patente neste filme em que a ignorância torna os seres humanos menos racionais e por vezes ridículos perante a evidência. De realçar a notável e soberba interpretação do consagrado Spencer Tracy que foi candidato ao óscar de Melhor Actor. Obteve mais 3 nomeações entre as quais a de Melhor Argumento. A riqueza dos diálogos é quase um tratado de literatura. Imperdível.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Liberdade

— Liberdade, que estais no céu...
Rezava o padre-nosso que sabia,
A pedir-te, humildemente,
O pio de cada dia.
Mas a tua bondade omnipotente
Nem me ouvia.

— Liberdade, que estais na terra...
E a minha voz crescia
De emoção.
Mas um silêncio triste sepultava
A fé que ressumava
Da oração.

Até que um dia, corajosamente,
Olhei noutro sentido, e pude, deslumbrado,
Saborear, enfim,
O pão da minha fome.
— Liberdade, que estais em mim,
Santificado seja o vosso nome.

Miguel Torga, in 'Diário XII'

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Olá

O meu amor nasceu com a vida
Cresceu com o rio até à foz
Foi flor do deserto e sobreviveu
Foi fonte de outras vidas

Mas tu meu amor, não sei quem és
Será que tu sabes?

Sabes, amor?
Estás tão perto mas não te conheço
Queria dizer-te “Olá”
E não sei como começar
Será que tu sabes?
CN2011

terça-feira, 26 de julho de 2011

25 de Abril

Esta é a madrugada que eu esperava

O dia inicial inteiro e limpo
Onde emergimos da noite e do silêncio
E livres habitamos a substância do tempo
SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN
O nome das coisas

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Poética


De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.

Vinícius de Moraes

segunda-feira, 16 de maio de 2011

A SOCIEDADE É A IMAGEM DO HOMEM

O aperfeiçoamento da Humanidade depende do aperfeiçoamento de cada um dos indivíduos que a formam. Enquanto as partes não forem boas, o todo não pode ser bom. Os homens, na sua maioria, são ainda maus e é, por isso, que a sociedade enferma de tantos males. Não foi a sociedade que fez os homens; foram os homens que fizeram a sociedade.

Quando os homens se tornarem bons, a sociedade tornar-se-á boa, sejam quais forem as bases políticas e económicas em que ela assente. Dizia um bispo francês que preferia um bom muçulmano a um mau cristão. Assim deve ser. As instituições aparecem com as virtudes ou com os defeitos dos homens que as representam.

Teixeira de Pascoaes, in "A Saudade e o Saudosismo"

segunda-feira, 28 de março de 2011

Partir

Eu vou-me embora para além do Tejo,
não posso mais ficar!
Já sei de cor os passos de cada dia,
na boca as mesmas palavras
batidas nos meus ouvidos...
-Ai as desgraças humanas destas paisagens iguais!..
Abro os olhos e não vejo
já não ando, já não oiço...
Não posso mais...
Grita-me a Vida de longe
e eu vou-me embora para além do Tejo.
Passa a ave no céu bebendo azul e diz: -Vem!
O vento envolve-me numa carícia,
envolve-me e murmura: -Vem!
As ondas estalam nas praias e vão mar fora,
as mãos de espuma a prender-me os sentidos
chamam no fundo dos meus olhos: -Vem!
- Camaradas, eu vou, esperai um pouco...
Ai, mas a vida nunca espera por ninguém...
E a noite chega vingadora;
o vento rasga-me o fato,
as ondas molham-me a carne
e a ave pia misticamente no ar;
abro os olhos e não vejo,
já não ando,já não oiço
-e fico, desgraçado de ficar!..
MANUEL da FONSECA

segunda-feira, 21 de março de 2011

Filmes a não perder (clássicos do cinema)

Para quem gosta de muita acção aliada a um argumento consistente e a boas performances, aconselho vivamente que vejam um dos melhores western de sempre: A Quadrilha Selvagem (The Wild Bunch), um clássico de 1969 realizado por Sam Peckinpah. Obteve 2 nomeações para os Óscares, entre as quais a de melhor argumento. Os actores são grandes estrelas da época: William Holden, Ernest Borgnine, Robert Ryan, Edmond O'Brien, Warren Oates e Emilio Fernández. Para quem já viu, de certeza que será um prazer rever.

quinta-feira, 17 de março de 2011

As eleições no Sporting 2011


Augusto Inácio, representante da candidatura de Bruno Carvalho, foi o primeiro a abordar o tema, de forma veemente - de acordo com o "Record" de hoje. "Comigo no Sporting nenhum jogador usará botas vermelhas e se possível todos usarão botas verdes", disse o ex-treinador campeão pelos "leões" (in Expresso on line de 17/3/2011).

O Sporting Clube Portugal é uma instituição que merece o respeito de todos nós, quer sejamos adeptos ou adversários. E o respeito passa pela elevação dos actos e das palavras principalmente de quem tem mais visibilidade, ou seja, dos dirigentes ou candidatos a tal. O amor ao clube não se explica e a rivalidade é salutar. O fanatismo e o anti-outros clubes que gera violência, já se explica cientificamente, porquanto podem ter a ver com patologias que compete aos médicos especialistas da área psiquiátrica avaliar.

No entanto, o que lemos na notícia acima, talvez não se enquadre no parágrafo anterior e não passe duma patetice. O Sr Augusto Inácio, que se candidata a Director Geral de uma grande instituição, acha que tudo o que é vermelho está associado ao Benfica. Espantoso! Uma das primeiras medidas a tomar, para o Sporting voltar às vitórias, é proibir os jogadores de calçarem botas vermelhas. Tão simples, como é que os anteriores presidentes nunca se lembraram disso?

Só espero que o Sr Augusto Inácio nunca precise de fazer uma transfusão de sangue, pois, certamente, não vai aceitar. A não ser que encontre algum dador com sangue verde.

CN – 17/3/2011

quarta-feira, 9 de março de 2011

Manuel de Arriaga

Era oriundo de famílias aristocráticas e descendente de flamengos.
O pai deixou de lhe pagar os estudos e deserdou-o.
Trabalhou, dando lições de inglês, para poder continuar o curso.
Formou-se em Direito.
Foi advogado, professor, escritor, político e deputado.
Foi também vereador da Câmara Municipal de Lisboa.
Foi reitor da Universidade de Coimbra.
Foi Procurador-Geral da República.
Passou cinquenta anos da sua vida a defender uma sociedade mais justa.
Com 71 anos, foi eleito Presidente da República.
Disse na tomada de posse: "Estou aqui para servir o país. Seria incapaz de alguma vez me servir dele..."
Recusou viver no Palácio de Belém, tendo escolhido uma modesta casa anexa a este.
Pagou a renda da residência oficial e todo mobiliário do seu bolso.
Recusou ajudas de custo, prescindiu do dinheiro para transportes, não quis secretário, nem protocolo e nem sequer Conselho de Estado.
Foi aconselhado a comprar um automóvel para as deslocações, mas fez questão de o pagar, também, do seu bolso.
Este SENHOR, Manuel de Arriaga, foi o primeiro Presidente da República Portuguesa.

Não deixou seguidores ou discípulos... 

Dia Internacional da Mulher


Não tenho filhos homens, mas se os tivesse, e um deles me perguntasse,
perante as coisas da vida, o que é uma mulher, dir-lhe-ia,
mesmo sabendo que não sei coisa nenhuma, que as mulheres:

São seres feitos de estrelas, de vento, de sol e lua,
moldados por tempestades e pelo sopro divino.

São anjos que nos protegem e demónios que nos tentam,
deixando-nos dominados se as provocamos sem querer.

São o corpo que tomamos quando elas querem assim e
a alma que não logramos aprisionar mesmo querendo.
São as mãos que acarinham e nos deixam sem acção,
ou se a acção nos consentem nos deixam enlouquecidos.

São nosso porto de abrigo onde as amarras nos prendem
depois de termos passado pelo bramido do mar.
São o repouso que queremos depois das guerras que vamos
provocando sem razão.

São guardiãs do passado, as obreiras do presente, as sibilas do futuro
já que tudo lhes pertence, mesmo que a gente não queira.
São o melhor de nós mesmos, mesmo que a gente não saiba
ou não queira admitir.

São as mães que nos geraram e nos protegem e amam
mesmo quando a gente estraga o amor que nos dedicam.
São as mães dos nossos filhos, filhas, irmãs e amigas.
São as nossas companheiras nos caminhos que trilhamos
de que sentimos a falta se abalam do nosso lado
e nos deixam sem a força que sustenta os nossos sonhos.

As mulheres são afinal a outra face de nós
completando o padrão criado pela natureza.

Podem ser tudo o que queres, o que sonhas e desejas,
um bocadinho de inferno ou um pedaço de céu.
Podem ser tudo na vida ou não ser coisa nenhuma,
como tu ou como eu.

Luis Filipe Duarte
8 de Março de 2011

terça-feira, 1 de março de 2011

Politiquices

O PS tem lutado pela modernização do país, pela educação e pela adopção de novos recursos que possam ser uma alternativa válida e sustentável, relativamente ao petróleo. No entanto, há uma responsabilidade que o PS tem perante a sua história como partido, que é o de ser um partido SOCIALISTA. Implica que o factor social tem de imperar nas medidas a tomar. Não pode pactuar a qualquer preço com o capitalismo, sem salvaguardar alguns valores que são a génese do partido. E o PS tem falhado redondamente neste aspecto. Por isso não me revejo no actual PS, nem acredito nos seus dirigentes.


O país civil precisa de dizer estou aqui e tenho uma palavra a dizer. A manifestação do próximo dia 12 de Março vai ser um teste à capacidade dos portugueses se indignarem ou não, perante o facto deste país, neste momento, não dar um futuro aos nossos filhos.

O capital, nomeadamente a BANCA, não está em crise e cada vez apresenta melhores resultados. Porque, quando um banco está em dificuldades, pagamos todos (os trabalhadores). Quando apresenta altos dividendos os beneficiados são apenas os accionistas.

Para além do que já escrevi, nem vale a pena referir os salários milionários pagos aos gestores de empresas públicas com a conivência do governo. Afinal, segundo o governo, a crise é para ser paga pelos que menos têm. Seus IMORAIS!

CN 01/MAR/2011

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Hora da partida

A hora da partida soa quando
Escurecem o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça.
A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.

Sophia de Mello Breyner Andresen

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Mão na mão

a tua mão desce lenta
no meu corpo ardente de desejo
terna e sentida
num extâse de prazer incontido

sinto a tua mão na minha mão
numa carícia que nos envolve e nos vicia
como as águas calmas acariciam a areia da praia
e no peito nos faz sentir o pulsar do paixão

acordo do sonho e encontro-te
o teu olhar funde-se no meu
e o amor envolve-nos em carícias
os nossos corpos sedentos unem-se
num misto de ansiedade e descoberta
entro em ti e a união é perfeita
na plenitude dos sentidos
o amor que fazemos é tão envolvente
que desse amor, tudo fica

porque depois do amor
o amor é maior

CNobre
… aprendizes da amizade
só sabiam usar braços.
Pobre analfabetos da ternura
Como se um abraço não viesse de dentro

Como se um homem sem braços
Não pudesse abraçar.

Sidónio Muralha

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O FIM DO SONHO (um conto)


A manhã raiou no monte despido, onde só as ervas dançavam ao sabor do vento incerto de Agosto. O sol perdera a sua timidez abrindo-se em raios de luz que inundavam toda a planície. Zé da Benilde aconchegou o seu cajado no ombro e contou o seu rebanho. Estavam todos, eram 37 ovelhas, 6 carneiros e 12 borregos.
Zé da Benilde era guardador de rebanhos desde os 5 anos de idade. Nunca tinha conhecido outro modo de vida. Não sabia ler nem escrever, apenas sabia ouvir e falar. Quando tinha 12 anos, o seu pai morreu e desde aí ficara com a responsabilidade do rebanho, que era o seu sustento e o de sua mãe. Cuidava também de um pedaço de terra junto ao monte, onde cultivava as batatas, hortaliças e tudo o que era necessário para sobreviver.
Zé da Benilde tinha agora 35 anos e toda uma vida dedicada aos seus animais e sabe Deus o quanto lhe custava quando tinha de vendê-las ao negociante que passava por lá, sempre que havia compradores. Conhecia o rebanho um a um, todas as suas manhas e dava-lhes nomes, a Noémia, a Atrevida, a Lanzuda, o Gaiolas ... e por aí fora. Ficava todo o tempo a observar o seu comportamento, o que comiam, o que faziam. 
O cheiro da madrugada transmitia-lhe aquela magia feita encanto, que lhe dava força e alento para o dia, mas o entardecer tornava-o triste: vida lixada esta que levas, pensava Zé da Benilde.
Um dia, uma borboleta, invulgar de tão bela, atraiu-lhe o olhar, por isso seguiu o seu esvoaçar esbelto e cadenciado, contrariamente ao que acontece com a maioria das borboletas que voam de forma atabalhoada. A borboleta escolhia as flores mais belas para pousar, depois levantava vôo, a seguir pousava de novo, e nunca parava.
O pior, é que depois levantou vôo para nunca mais ser vista.
Zé da Benilde parou e pensou. Que teria dado na borboleta? Se tinha ali tantas flores bonitas e atraentes, porque diabo havia de ir para outras paragens? Será que havia flores ainda mais bonitas e que ela tinha ido procurá-las?  Zé olhou o céu, limpou a testa do calor que o fazia transpirar e encolheu os ombros. Sentou-se numa pedra à sombra de um sobreiro, chamou o Jói, o seu fiel companheiro, um rafeiro alentejano que era o seu braço direito nas lides, e enquanto lhe fazia festas na cabeça, sonhava.
Ao entardecer mandou o cão juntar o rebanho e regressou a casa com a sensação que toda aquela imensidão por onde vagueava com os animais era apenas um pouco do mundo e embora se sentisse livre, concluiu que lhe faltava muita coisa para se completar como homem. Precisava voar, conhecer outras gentes, outras coisas, enfim, socializar-se.
Vai daí e o Zé decidiu conhecer a grande cidade onde tudo acontece. Vendeu os animais que lhe renderam bom dinheiro, pagou a uma senhora para cuidar da sua mãe, deixou-lhe o dinheiro suficiente e partiu para a aventura.
Eram deslumbrantes as cores néon, gente a circular por todos os lados, cinemas, teatros, espectáculos de todo o género, gente bonita, muita vida, muita alegria. Alugou um quarto na Pensão Vitória, no Poço do Borratém e decidiu gozar a noite de Lisboa. Entusiasmado, foi ao Intendente beber um copo e quando foi pagar, a carteira tinha desaparecido. Ainda pensou: será que me esqueci dela no quarto? Foi o que disse ao senhor do bar enquanto uma menina bonita bebia com ele, esperando que lhe pagasse a bebida. Pouco convencido, o dono do bar chamou o segurança que lhe deu uma surra tão grande que o deixou todo negro e caído no chão da rua.
Sem dinheiro, procurou um emprego, que só encontrou na recolha do lixo. Trabalho duro que lhe deu a conhecer o lado pior que a cidade pode ter. Marginal e miserável. Pessoas que tentavam obter alimentos nos restos que os outros jogavam fora, drogados e marginais que circulavam na escuridão e toda a podridão de uma sociedade decadente que caminhava para o abismo.
Uma noite foi com alguns colegas do lixo ao Salsa Latina e acabou envolvido no assalto a uma caixa multibanco. A polícia, que se encontrava nas imediações, foi avisada e todo o grupo foi preso.
Levado para os calabouços da polícia é reconhecido por uma prostituta adolescente, como sendo um violador de menores. O violador do Jamor! Incrédulo e completamente desorientado, Zé da Benilde não teve garras para se defender de tanta confusão gerada à sua volta. Lembrou-se da borboleta insatisfeita e da vida feliz que tivera. As suas ovelhas, o seu cão Jói. Afinal os melhores amigos que sempre tivera e que abandonara a troco de uns míseros euros para correr atrás de um sonho utópico.
Foi num dia de Outono que apareceu pendurado na sua cela, enforcado!
No entanto, há quem fale em homicídio, porque, diziam, a ética entre os prisioneiros não admite violações a menores.
Vá-se lá saber onde mora a verdade!
Será que a verdade interessa à justiça desta sociedade?


C.N. 2010

NO MEU TEMPO

No meu tempo, o casamento era fruto do amor entre duas pessoas de sexos diferentes. Agora deixou de ser. Acabo de saber que o amor não existe apenas entre um homem e uma mulher. Esta geração descobriu que o conceito de amor é muito mais lato. Existe também entre dois homens ou entre duas mulheres. Então toca de arranjar meios legais, apadrinhados pelo nosso presidente, para que um homem possa casar com outro homem e uma mulher possa casar com outra mulher.

Na natureza as fêmeas acasalam com os machos, salvo nos casos de hermafroditismo. Agora provou-se que a natureza nem sempre tem razão.

Mas esta geração impõe um limite: embora considere o amor como um conceito muito mais abrangente que a geração anterior, só pode acontecer entre seres humanos. Quem pense que pode casar com o cão ou com o gato (ou com o burro), tire daí a ideia. Ainda que goste mais do animal do que de qualquer ser humano.

Como o Estado constitucionalmente se considera ateu, há que contemplar também na lei o casamento polígamo, já que, "Na sua origem, o ser humano é polígamo", conforme confirma a famosa sexóloga Erika Morbeck, bem como o casamento grupal. O respeito pela liberdade de pensamento impõe, igualmente, a sua legalização.

No meu tempo, os rapazes apaixonavam-se pelas raparigas e sonhavam com o dia em que se uniam pelo matrimónio. Era o dia mais feliz das suas vidas. Concretizavam, assim, o sonho de uma vida e nascia o fruto do amor que dedicavam um ao outro: os filhos.

No meu tempo …

Ai que saudades desse tempo!

C.Nobre [8/JUN/2010]

O FUTURO DO PENSAMENTO ECONÓMICO

Todos os diagnósticos económicos actuais encontram-se padronizados pelo pensamento económico neoclássico. Existe claramente uma tendência para uniformizar o pensamento económico, tornando-o desinteressante, o que pode colocar em causa a existência da Economia como disciplina autónoma, substituindo-a por outros ramos da ciência.

São notórios os avanços nas ciências do conhecimento humano e assustadores os avanços tecnológicos, alterando os comportamentos sociais, enquanto que as teorias económicas passaram mais ao domínio da literatura do que à ciência.

A necessidade de interligar a economia com outras áreas tem vindo a ser incentivada na atribuição de alguns prémios Nobel, nomeadamente, em 1991 a Ronald Coase, cujo trabalho se situou entre a Economia e o Direito, em 1992 a Gary Becker, premiando o desenvolvimento no campo da análise dos mais variados aspectos do comportamento humano, em 1993 a Robert Fogel, no campo da História Económica e principalmente em 1988 ao ser laureado o indiano Amartya Sen, pelas suas contribuições para a economia do bem estar (1), situando o prémio no limite entre a Economia e a Filosofia.

A análise empírica, o desenvolvimento da economia experimental e a aliança com outras ciências sociais, trarão certamente novos contributos para o bem estar dos povos, descapitalizando o que é humano e humanizando o capital. Ou não fosse esse o objectivo da economia: a satisfação das necessidades humanas através da distribuição equilibrada dos bens produzidos, tendo em conta a realidade dos povos e das suas culturas.

C.Nobre (2000)

(1) Para medir o desenvolvimento de uma economia é imperioso levar em conta, para além dos indicadores tradicionais, o Índice de Desenvolvimento Humano e o Índice de Pobreza Humana.